quinta-feira, 13 de setembro de 2007

a-ma-du-re-cer;

quando lembrei que não lembrava mais, entrei em pânico. quando ouvi aqueles primeiros cinco ou seis segundos daquela música, me lembrei de uma sensação esquecida. não de rostos e sabores, nem de detalhes e de vozes, porque o efêmero foi feito para ser esquecido mesmo... mas eu entrei em pânico porque não lembrava mais daquelas palavras ditas numa madrugada de setembro, ou do medo e do amor e da cumplicidade... simplesmente todos aqueles rostos haviam escapado da minha memória e se transformado em alguns segundos de uma música. foi ai que eu entendi que não havia tido um surto de amnésia, mas sim um crescimento interno, um novo olhar, a lucidez de um certo distanciamento. permiti a mim mesma compreender aspectos meus e alheios antes obscuros. entendi perfeitamente que de "esquecimento" o nome passou para "amadurecimento". todo mundo sabe que às vezes a gente precisa se desfazer de algumas coisas. eu me desfiz de lembranças, de uma infantilidade que já nem era propriamente infantilidade... agora aquela sensação boa e segura de ter tudo sob controle tá presa à um solinho de guitarra... graças a deus, eu digo, porque faz bem deixar o passado virar passado, não faz? faz bem limpar armário, trocar as fotos do mural, tirar as folhas velhas de dentro dos cadernos. amadureci e é legal ver as coisas que eu fiz do jeito errado com olhos de vovó sábia. amadureci e não escrevo isso como se fosse uma autoafirmação. escrevo porque eu me perdoei por ter esquecido, ou melhor, amadurecido. promoveu-se uma espécie de anistia. gosto de usar essa palavra. é melhor que perdão, porque não tem nada a ver com deus e nem dá a idéia de que somos bonzinhos perdoando alguém.
nem a nós mesmos.

domingo, 9 de setembro de 2007

ser ou não ser;

é uma idéia assustadora: vivemos segundo o nosso ponto de vista, e com ele sobrevivemos e naufragamos. explodimos e congelamos conforme nossa abertura ou exclusão em relação ao mundo. porque mesmo se formos armados, sofremos de uma carência elementar. ainda que protegidos, seremos expostos a imprevistos contra os quais nada nos defende. temos de criar essas malditas barreiras, e ao mesmo tempo lançar pontes com o que nos rodeia e o que ainda nos espera. toda essa trama de se encontrar e de perder, terror e indefinição do futuro, começa quando nos perguntamos: ser ou não ser? quando a gente desperdiça uma vida e trunca nossos talentos e esperanças se não tivemos a audácia para usufruir deles e da vida em si. quando fazemos uma retrospectiva e analisamos cada ação passada para fazer melhor no futuro. quando cai o telhado da certeza de quem somos, de onde viemos e para onde vamos. essa história de auto-questionação é uma merda mesmo, até porque não é fácil deixar de ser um fantoche para ser um "eu", para ser "você", para ser quem queremos ser, devemos ser ou achamos que devemos ser. constituir um ser humano que pergunta é trabalho que não dá férias. o que se produzir, o resultado desse longo martírio existencial, será a soma do que pensamos de nós, do que fizeram pensar que valemos, do que fizemos para mudar o que somos e o que esperamos receber de nós. no fim, contruimos nossa própria personalidade, e apartir desse momento, podemos duvidar de todo esse resultado. porém, tudo isso seria ainda simples demais. nessa argamassa mistura-se boa vontade, curiosidade, corações partidos, caminhos errados, lembranças esquecidas. participamos de uma singular dança de máscaras sobrepostas, atrás das quais somos o objeto de nossa própria inquietação. nem inteiramente vítimas, mas nem inteiramente mandantes, cada momento de cada dia, um desafio. essa ambigüidade, esse ser ou não ser, nos dilacera e nos alimenta, uma razão a mais para viver: descobrir quem realmente somos e quem é aquele estranho no espelho que é assim tão... humano.