quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

De mudança

Sabe, escrever é uma coisa que parece ter nascido grudada em mim, mas não sei exatamente de que forma, nem quando, que descobri a paz e a dor que a escrita me proporciona.
E eu quero escrever, quase todo o tempo - mas os enredos, os personagens, os parágrafos perfeitamente articulados, não saem da minha cabeça. Isso me dói de uma forma quase torturante, então eu acabo perdendo algumas horas de sono lendo uns manuais estranhos de construção & teoria literária; como arquitetar suas frases (para que não haja nenhum elemento desnecessário, que quebre qualquer harmoniosa sequência), seus diálogos, seus narradores, seu espaço-tempo, e, claro, tudo de uma forma nada didática. Uma velharia da universidade federal do Rio Grande que eu catei uma tarde na biblioteca da escola. Ok. Sono perdido. Lá vem ele de novo: o fantasma da criatividade reprimida, e olha, uma coisa eu posso dizer, não há nada no mundo que ocupe mais espaço dentro da gente como o impulso de criar.
E eu levo a literatura muito a sério, ainda mais depois que terminei meu primeiro livro "de gente grande", Espelho Partido, de Mercè Rodoreda, uma escritora catalã que levou uns 28 anos pra escrever sua obra prima. Em cada palavra eu sentia como se ela estivesse contando tudo aquilo ao vivo pra mim, sentada nos pés da minha cama. As coisas se materializavam. Os cheiros, as vozes, e cada vírgula estava ali onde estava não por estética - era necesessária uma pausa para respiração do leitor, transformando tudo, colocando as coisas em seus devidos lugares, elevando cada frase à um patamar surreal de beleza. Relia os trechos em voz alta. E eu chorei tanto, tanto. Aquilo me tocou de uma forma tão verdadeira, que eu acordei uma manhã, o livro todo amassado embaixo da minha bunda, e falei pra empregada: eu quero escrever assim.
Depois, foi só ladeira abaixo. Vieram tantos outros autores, que sentaram na minha cama antes da minha hora de dormir, e a cada livro me apaixonava pelos seus personagens, por Barcelona e por Salvador, por suas vírgulas, pontos, travessões, pela maestria com que conduziam a história, construindo estilo e ritmo próprios, exatamente da forma que queriam. Grandes autores jamais se deixam conduzir por sua própria técnica. É um longo caminho a ser percorrido.
Agora estou aqui, no meio de uma crise. As idéias estão aqui também, junto comigo. Toda minha bagagem de títulos e manuais e gramáticas e etc etc etc estão aqui. Tenho inspirações a todo momento, analisando filmes, olhando a rua, o céu, observando a vida correndo e correndo. Algo me bloqueia... ja tentei meditação. Yoga. Budismo. I-Ching. Pai Nosso. Benzedeira. Até deixei baiana jogar os búzios pra mim, me perfumar de alfazema, e encaixar um patuá de Oxum no meio do decote. Nada de inferno astral, eu sou taurina arretada, e esse é o ano de Touro, flores amarelas no mar, pro tal Oxum. Mas é isso ai, esse blog só me lembra da minha quase-sina de querer escrever, mas não conseguir produzir nada digno de um post aqui. É frustrante.
Então ontem abri uma conta no Tumblr, que eu acho mais bonito e mais organizado, e já me mudei, carregando junto a esperança de que assim, os ares se renovem, a poeira baixe, e eu consiga, talvez, soltar o meu freio de mão.
De qualquer forma, significa muito pra mim divulgar minhas bobagens, e não preciso nem saber que alguém lê, só me sinto segura sabendo que nada se perderá no anonimato. Espero que as pessoas entendam meu jeito exageradíssimo de caracterizar tudo, meu gosto pelos adjetivos, pelas palavras doces, pelos momentos fugazes, e espero ainda que levem um pedacinho de mim para suas vida, através do que eu escrevo (com tanta dor e alegria).

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